Isabel de Carvalho Garcia, Silvino Lopes Évora, Inês Amaral, José Soares Tavares
No passado dia 26 de Novembro, decorreu em Coimbra o lançamento do livro “Concentração dos Media e Liberdade de Imprensa”, de Silvino Lopes Évora – poeta, jornalista, investigador do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade da UMinho, Professor na Universidade de Cabo Verde e na Universidade Jean Piaget de Cabo Verde. A apresentação da obra, editada pelas Edições MinervaCoimbra, esteve a cargo de Inês Amaral.
Paulo Soares, Inês Amaral, José Soares Tavares
Texto publicado por Inês Amaral em http://blog.ciberesfera.com/?p=691
«A este propósito, deixo algumas notas sobre um livro que recomendo vivamente e que, dado o actual momento em Portugal, não poderia ser mais actual. Porquanto o contexto mediático português está cada vez mais marcado pela questão da concentração da propriedade dos media.
O livro ”Concentração dos Media e Liberdade de Imprensa” é uma obra muito rica e, em simultâneo, “inquientante” – nas palavras da Professora Doutora Helena Sousa no prefácio. Porque se debruça sobre a percepção que os jornalistas portugueses têm da liberdade de expressão e da liberdade de imprensa face à concentração dos media em grandes grupos. O texto procura compreender e retratar o que é a liberdade para o jornalista e de que forma a sua identidade profissional está ou não condicionada pela concentração da propriedade dos meios de Comunicação Social.
Silvino Lopes Évora trouxe o conhecimento da Academia para a análise do mercado de trabalho, procurando tomar o pulso à percepção que os jornalistas portugueses fazem do exercício da liberdade imprensa, assumindo-a como condição essencial para a prática profissional do jornalismo. O autor quis, então, compreender se a concentração da propriedade dos órgãos de Comunicação Social limita a actuação dos jornalistas.
O autor destaca, antes de mais e bem, o facto da liberdade de imprensa e a liberdade de expressão permitirem a formação do debate público, que é condição essencial para a formação das consciências individuais e colectivas. O principal objectivo desta obra, largamente atingido, é perceber como se exerce o direito à liberdade de imprensa num contexto em que a maioria dos meios de Comunicação Social funciona segundo as lógicas do mercado, integrando grupos de considerável dimensão. Neste sentido, primeiramente Silvino Évora faz uma incursão por dois corpos de literatura. Num primeiro momento, aborda a economia política da comunicação para compreender as lógicas que fundamentam a integração dos grupos e as dinâmicas da concentração mediática. O segundo corpo da literatura estudado foi a Escola de Frankfurt, olhando os seus argumentos sobre as indústrias culturais para procurar ter uma postura mais crítica em relação à natureza das próprias notícias.
Na segunda parte do livro, o autor apresenta um interessante e abrangente estudo empírico que visa compreender a percepção dos jornalistas portugueses relativamente ao exercício da liberdade de imprensa. Procura perceber que áreas de cobertura jornalística são mais sensíveis à problemática da concentração dos media, qual a percepção que os jornalistas têm acerca dos actuais níveis de concentração de empresas de Comunicação Social em Portugal e até que ponto a precariedade de emprego influencia a qualidade da informação que chega ao público. Silvino Lopes Évora aborda ainda a questão dos jovens jornalistas, tentando perceber de que forma os que agora ingressam a profissão encaram a situação.
O estudo empírico começa por uma interessante análise da concentração da propriedade dos media, partindo dos cenários e tendências globais para, posteriormente, se centrar nos actores portugueses e retratar, em particular, quatro grupos: Imprensa, Media Capital, Cofina e ControlInveste. A investigação está dividida numa perspectiva de territórios: – o território da liberdade de imprensa e a percepção dos jornalistas; – o território da concentração dos media em Portugal e a percepção dos jornalistas; – o território das notícias, isto é, a prática das notícias e a percepção dos jornalistas.
Os resultados deste trabalho empírico, que resulta da implementação de inquéritos a 100 jornalistas profissionais e seis entrevistas de profundidade, revelam interessantes conclusões. Alguns resultados merecem particular destaque:
- a maioria dos jornalistas considera que a liberdade de imprensa é insuficiente para a prática de um jornalismo completamente livre e isento;
- grande parte dos jornalistas argumenta que a concentração dos media “domestica” quase todos os profissionais e que a auto-censura é o caminho de defesa adoptado por muitos profissionais;
- a maioria admite que a concentração da propriedade dos media obriga muitos jornalistas a abandonar determinados assuntos para evitar problemas com a administração da empresa;
- sobre a auto-censura: a maior parte considera ser mais frequente, mas 27% da amostra trabalhada sublinha a censura das administrações das empresas como sendo frequente e 17% destaca também a censura externa à empresa;
- a precariedade de emprego é uma preocupação transversal a toda a amostra e é apontada como o principal factor de “domesticação” dos jornalistas;
- a maior parte dos jornalistas inquiridos considera que a concentração é excessiva e que os actuais níveis são prejudiciais ao pluralismo da informação, defendendo que favorece mais as finanças das empresas do que a necessidade pública de informação. Ainda assim, o lugar do jornalista na empresa é interpretado pelos próprios como factor de sucesso ou insucesso desta;
- muitos dos jornalistas que sustentam que a concentração é excessiva, argumentam também que ela é necessária mas que limita a cobertura jornalística – em particular nas áreas da Política e da Economia;
- poucos jornalistas revelam sentir-se pressionados mas admitem que existe pressão nas empresas.
Esta obra levanta o véu sobre outro fenómeno que domina a classe jornalística portuguesa e que está directamente relacionada com mecanismos de defesa que advêm do medo, da precariedade de emprego e da própria concentração da propriedade dos meios de Comunicação Social. Neste sentido, o estudo de Silvino Évora mostra que, em cenários abstractos, os jornalistas portugueses admitem que a concentração dos media é um factor prejudicial para o exercício do direito à liberdade de expressão. No entanto, quando se referem à sua experiência, a maior parte considera que é livre mas os outros jornalistas não são. Como destaca e bem o autor, estes mecanismos de defesa procuram igualmente passar valores de autonomia, isenção e independência.
Silvino Évora destaca, e bem, a dificuldade de estudar a concentração dos media. Efectivamente, as razões da complexidade deste campo de investigação passam pela postura defensiva dos jornalistas e das empresas para as quais estes trabalham. O autor conclui que os profissionais do jornalismo em Portugal têm plena consciência dos constrangimentos que a concentração da propriedade dos media imprime à profissão. Neste sentido, considera que a liberdade de informação é insuficiente para a prática de um jornalismo que responda à verdadeira necessidade pública de informação.
O estudo de Silvino Évora é dinâmico e muito esclarecedor da situação dos jornalistas portugueses, indiciando práticas de auto-censura e limites à liberdade de imprensa. A precariedade de emprego é apontada como o principal factor que contribui para a degradação do direito à liberdade de imprensa e, neste sentido, para a própria deterioração do próprio espaço público. A principal conclusão desta obra é a de que a concentração da propriedade dos media limita o exercício do direito à liberdade de imprensa. É nesta perspectiva que o autor sublinha a necessidade de repensar o mercado profissional e, sobretudo, “apertar” a vigilância às condições em que os jornalistas mais novos trabalham. Silvino Évora sublinha que “no contexto mediático português, a luta pela liberdade de imprensa passa por compreender a economia dos media e os processos subjacentes ao próprio negócio da Comunicação Social”. O autor deixa a indicação de que se, por um lado, é importante a autonomia dos media; por outro, é urgente evitar que o sector dos media se transforme num campo estritamente económico onde as empresas batalham única e exclusivamente pelo lucro.
Declaração de interesses: Silvino Lopes Évora é meu colega no CECS, foi meu companheiro nas aulas do Mestrado e é, sobretudo, meu amigo.»
Inês Albuquerque Amaral
Sessão enquadrada nas Actividades Comemorativas do X Encontro dos Tarrafalenses e Amigos do Tarrafal em Portugal da qual deixamos aqui informação.
«Estudantes cabo-verdianos em Coimbra marcam a diferença. Os do concelho do Tarrafal de Santiago, que albergou o antigo Campo de Concentração, estão particularmente activos. Depois de 11 anos do primeiro encontro, voltam-se a reunir, no passado fim de semana, num evento que herdou o nome do santo patrono do Concelho (Encontro Fidjus de Santo Amaro Abade). A coordenação do evento foi levada a cabo pelo Núcleo de Estudantes Tarrafalenses em Coimbra (NETC), que tem à cabeça Paulo Soares, que também é Presidente da Associação dos Estudantes Cabo-verdianos em Coimbra.
O ponto alto do encontro dos filhos de Tarrafal em Portugal culminou com o lançamento da obra científica de Silvino Lopes Évora, Prof. das Universidades Jean Piaget e Pública de Cabo Verde. A obra tem como título “Concentração dos Media e Liberdade de Imprensa”, fazendo um mapeamento das práticas jornalísticas em Portugal. Silvino Lopes Évora, filho de Tarrafal, estudou em Coimbra. Ali cursou Jornalismo, para depois fazer uma Pós-graduação em Jornalismo Judiciário na Universidade Católica de Lisboa. Rumando-se a norte em 2004, concluiu, em 2006, o Mestrado e, em 2010, o doutoramento em Ciências de Comunicação. Ambos os graus foram alcançados na Universidade do Minho. Ambas as teses contaram com a orientação da Prof. Dr. Helena Sousa, pessoa que o autor considera incontornável na sua trajectória académica. Silvino Lopes Évora, para além de Prof. Universitário e investigador, também é jornalista e poeta. Em 2009 lançou a obra “Rimas no Deserto – Poemas Inéditos”. Em 2010, lançou uma outra obra poética intitulada “O Passaporte da Diáspora”. A primeira foi publicada em Lisboa e a segunda no Porto. No mesmo ano de 2010, ganhou dois prémios científicos: com a sua tese de doutoramento, que está a ser publicado na Biblioteca Nacional de Cabo Verde – com o apoio do Ministério da Cultura do mesmo país –, ganhou o “Grande Prémio Cidade Velha”. Com um ensaio sobre a evolução da liberdade na África Ocidental venceu o “Prémio Orlando Pantera – Talento Jovem”.
O encontro contou com a presença de José Soares Tavares, Vereador da Cultura, Desporto e Promoção do Concelho da Câmara Municipal do Tarrafal. A editora MinervaCoimbra, que editou o livro de Silvino Lopes Évora, fez-se presente através de Isabel Garcia, que realçou a importância do trabalho para a Colecção Comunicação, dirigida por Mário Mesquita. No curso da apresentação da obra, que foi feita pela Doutora Inês Amaral, do Instituto Superior Miguel Torga, Paulo Soares lançou um repto ao Vereador da Cultura do Tarrafal e a todos os presentes para a criação de uma Biblioteca local em Chão Bom, ao qual seria atribuída o nome de “Biblioteca Silvino Évora”. Não se comprometendo, o Vereador da Cultura da Câmara Municipal do Tarrafal disse que o assunto teria de ser devidamente analisado.
Porém, tanto a apresentadora da obra Inês Amaral como a editora Isabel Garcia, da MinervaCoimbra, mostraram-se entusiasmadas com a ideia, disponibilizando-se para abraçar a ideia, contribuir com livros e fazer campanhas para montar a referida biblioteca. Também, o Vereador de Cultura da Câmara Municipal da Marinha Grande, que esteve presente, mostrou a sua disponibilidade em unir forças para dar corpo à ideia apresentada por Paulo Soares.»
Porém, tanto a apresentadora da obra Inês Amaral como a editora Isabel Garcia, da MinervaCoimbra, mostraram-se entusiasmadas com a ideia, disponibilizando-se para abraçar a ideia, contribuir com livros e fazer campanhas para montar a referida biblioteca. Também, o Vereador de Cultura da Câmara Municipal da Marinha Grande, que esteve presente, mostrou a sua disponibilidade em unir forças para dar corpo à ideia apresentada por Paulo Soares.»
***
O livro
Regista-se hoje nos países ocidentais o predomínio do capital privado no sector da comunicação social,assumindo os processos de concentração da propriedade grande protagonismo nas dinâmicas financeiras. Desta feita, teóricos, analistas e observadores, inspirados em argumentos frankfurtianos, têm referenciado a concentração dos media como um dos principais entraves ao exercício da liberdade de imprensa, nas sociedades democráticas.
Em Portugal, os jornalistas entendem que a concentração diminui o número de empregadores, reduzindo, por conseguinte, a quantidade de postos de trabalho e a sua autonomia profissional. Para estes profissionais, a concentração contribui para o aumento de desemprego, de auto-censura e da precariedade, diminuindo os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Este livro é o nº 55 de Colecção Comunicação - série jornalismo.
Sem comentários:
Enviar um comentário