quarta-feira, julho 18, 2007

Caminhos do sonho encerram temporada das Terças-Feiras de Minerva


A Livraria Minerva encerrou mais uma temporada das Terças-Feiras de Minerva com um recital de poesia por Amélia Campos, do grupo Thíasos do Instituto de Estudos Clássicos, e José Ribeiro Ferreira.

O recital, intulado "Caminhos do Sonho", foi uma homenagem a Antero de Quental e Cecília Meireles, mas incluiu ainda poemas de Sebastião da Gama, David Mourão-Ferreira, Fiama Hasse Pais Brandão, Manuel Alegre e José Ribeiro Ferreira.

A anteceder esta leitura vários convidados e autores das Edições MinervaCoimbra leram também alguns poemas de sua autoria, nomeadamente, Maria Lucília Mercês de Mello, António Vilhena, António Arnaut, Joaquim Carvalho, Júlio Correia, José Ribeiro Ferreira e Delfim Leão.

As sessões das Terças-Feiras de Minerva regressam em Setembro.







Acordando

Em sonho, às vezes, se o sonhar quebranta
Este meu vão sofrer, esta agonia,
Como sobe cantando a cotovia,
Para o Céu a minh'alma sobe e canta.

Canta a luz, a alvorada, a estrela santa,
Que ao mundo traz piedosa mais um dia…
Canta o enlevo das coisas, a alegria
Que as penetras de amor e as alevanta…

Mas, de repente, um vento húmido e frio
Sopra sobre o meu sonho: um calafrio
Me acorda. — a noite é negra e muda: a dor

Cá vela, como dantes, ao meu lado…
Os meus cantos de luz,anjo adorado,
São sonho só, e sonho o meu amor!

Antero de Quental
Poesia Completa (Lisboa, 2001), pp 244








Sonhos da menina

A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?

Sonho
risonho:

o vento sozinho
no seu carrinho.

De que tamanho
seria o rebanho?

A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha…

Na lua há um ninho
de passarinho.

A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?

Cecília Meireles
Poesia Completa (Rio de Janeiro, 1994), pp 811-812







O Sonho

Pelo Sonho é que vamos,
comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo Sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
com a mesma alegria,
ao que desconhecemos
e ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chgeamos?

— Partimos. Vamos. Somos.

Sebastião da Gama
Pelo Sonho é que Vamos (Lisboa, 1971), pp 59







Ulisses e Nausícaa

Não tinha sido fábula a saudade
de estar ao pé de mim sem estar comigo:
vejo-te agora em água, areia, carne,
e és o culto no sonho pressentido!

Cheiro de rocha a que não chega o mar,
por mais que o mar invente marés vivas…
Reconheço-te, ó palma tão sem par:
és a graça da terra ao céu erguida.

Pisas, ao caminhar, o próprio vento,
que se embuçou no manto de uma duna…
Desfazes sob os pés os grãos do tempo,

por do Tempo não teres noção nenhuma…
De que me serve ter vencido sempre,
se aqui me vence a tua juventude?

David Mourão-Ferreira
Obra Poética (Lisboa, 1996), pp168

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