quinta-feira, outubro 23, 2008

Perspectiva de formação está esquecida na educação

João Matos Boavida, Helena Damião e Isabel de Carvalho Garcia


João Matos Boavida, professor da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra foi o primeiro convidado do ciclo “O Dever de Educar” que as “Terças Feiras de Minerva” iniciaram esta semana. Numa sessão conduzida por Helena Damião, também professora FPCEUC, João Matos Boavida falou precisamente de “O Dever de Educar” na actualidade.

O especialista em educação começou por recordar a diferença entre educar e instruir que, afirmou, “está um pouco esquecida”. Actualmente, as crianças vão para a escola para se prepararem em termos cognitivos para uma profissão, mas para João Matos Boavida, o mais necessário nos dias de hoje “é a educação numa perspectiva de formação, conceito que tem vindo a perder terreno em relação à perspectiva instrução”.

Segundo o docente da Universidade de Coimbra, “há uma demissão generalizada que corresponde ao empalidecimento de certas regras e de certas formas de fazer e toda a gente sente que isto é um problema actual. Penso que a ideia do dever de educar no sentido de obrigação tem que ser recuperada e não entra em contradição com a escolaridade”. A verdade é que “a escolaridade aumentou, mas simultaneamente houve como que uma espécie de demissão da escola na formação dos jovens”.

Por outro lado, afirmou o especialista, “a ideia de que a criança e o jovem se podem desenvolver naturalmente, auto-orientando-se, porque têm em si as condições para o conseguir, e de que os educadores não devem intervir porque é sempre um processo de coacção e de prejuízo, é uma ideia romântica mas está errada”. Os jovens, referiu ainda, “devem ser educados com uma razoável dose de liberdade, porque evidentemente precisam de ser estimulados de forma harmoniosa, mas há formas de controlo, há inserções sociais, há enquadramentos, há objectivos que a sociedade tem obrigação de ir fornecendo”.

A educação é um processo de transformação comportamental em função de uma melhoria, de uma qualificação, de um aperfeiçoamento, explicou João Matos Boavida. Mas “a própria ideia de aperfeiçoamento caiu, de algum modo, em desuso nalgumas esferas. Temos noção do que é um atleta que se treina para atingir um certo nível, com objectivos muito concretos em termos de rendimento, mas em termos de qualificação e de formação isso já não existe”.

Esta é uma noção que não existe em termos de “aperfeiçoamento espiritual, desenvolvimento intelectual, alargamento de cultura, capacidade de interpretação e análise, formas de compreensão e de interpretação que são coisas muito mais vagas mas que deviam funcionar da mesma forma. Há uma diluição desta problemática, até pela multiplicação de métodos pedagógicos que são, hoje, muito mais dispersos, mais diluídos”, lamentou ainda o especialista numa sessão largamente participada pelo público presente, e que culminou num saudável debate.

Organizado por Helena Damião, João Matos Boavida, Isabel de Carvalho Garcia, Mónica Vieira e Aurora Viães, o ciclo “O Dever de Educar” pretende discutir com os convidados — escritores, cientistas, filósofos, artistas, investigadores, jornalistas e estudantes —, e em forma de entrevista, como tem sido entendido o dever de educar. Como é, ou como deve ser, entendido na actualidade.

Estes encontros, com uma regularidade quinzenal, serão destinados a todos os que possam ter interesse pela educação. As sessões são abertas ao público e o ciclo continua com sessões a 4 e 18 de Novembro e a 2 e 16 de Dezembro. Nas outras terças feiras, de uma forma alternada, serão abordados outros temas que vão desde a literatura, poesia, arte, gastronomia, saúde até aos grandes temas da actualidade.





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