"Talvez ao nível de audiovisual os jornalistas conheçam melhor o share, o número de pessoas que estão disponíveis para comprar, para ouvir, para ver as audiências. Mas os públicos, na acepção de saber o que pensam, o que desejam, o que precisam, isso acho que não. O jornalismo tornou-se muito comercial, mas não sei se pode ser de outra maneira. Mas há algo a fazer", disse Estrela Serrano ao DN.
Referindo-se a José Nuno Martins e Paquete de Oliveira, provedores do ouvinte e do telespectador da Rádio e Televisão de Portugal, a autora de Para Compreender o Jornalismo considerou que os (novos) provedores "vão melhorar muito a relação das televisões com os públicos, vão complementar a crítica dos profissionais da crítica, que é muitas vezes radical, vão mostrar e vão explicar que a televisão, os media, são muito feitos de contextos."
Nas palavras que dirigiu à plateia atenta e que marcou presença na livraria Bulhosa, Estrela Serrano apontara: "a sua tarefa vai ser ainda mais difícil do que foi a minha".
Período difícil nos media
O livro de Estrela Serrano foi apresentado por Mário Bettencourt Resendes, antigo director do DN e que, em 1997, criou a figura do provedor do leitor, numa iniciativa inédita em Portugal. A docente universitária e membro do conselho regulador da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) foi a terceira Ombudsman do jornal, sucedendo no cargo a Mário Mesquita e Diogo Pires Aurélio.
Resendes considerou que o mandato de Estrela Serrano coincidiu com "um dos períodos mais difíceis na imprensa portuguesa e nos media em geral", marcado pelos ataques do 11 de Setembro, a Guerra do Golfo e o caso Casa Pia. Esta conjuntura "enriqueceu a matéria que a Provedora analisou", referiu.
O livro Para Compreender o Jornalismo cristaliza agora algumas das questões que marcaram esse período, ultrapassando o "carácter efémero" de uma coluna de jornal. A autora quer fixar de uma maneira mais duradoura, "uma reflexão sobre o jornalismo e os jornalistas".
A sugestão do nome da ex-provedora do DN partiu de José António Santos, à época director-adjunto do jornal. "Uma mulher como provedora tinha um carácter inovador e além disso Estrela Serrano tinha um perfil que se ajustava à função", assumiu Resendes.
Já sobre o seu desempenho, o ex-director do DN foi mais crítico: "nas direcções dos jornais deveria haver um limite" de dez anos. Mário Bettencourt Resendes foi, durante 12 anos, director do jornal e assumiu que nos últimos dois as "reservas anímicas" estavam em baixo. "Estas coisas cansam", admitiu.
Resendes assumiu ainda os "sentimentos mistos" que um director tem em relação à figura do provedor: "há uma lógica conflitual, latente, genética mas alguma coisa está mal se a redacção e o provedor forem um caso de lua-de-mel..."
Estrela Serrano não esconde a "satisfação" que o cargo lhe deu. "Dormia e acordava a pensar no que ia escrever", disse a ex-provedora que não se quis limitar a ser reactiva. Até porque - enfatizou Bettencourt Resendes - "muitas vezes o universo de leitores que questionam o provedor é restrito."
No entanto, a ex-provedora diz que os leitores a desafiavam para escrever sobre imensas coisas - o que "achava estimulante".
Mário Mesquita, também director da Colecção Comunicação da Minerva (a que se junta agora o novo título de Estrela Serrano), destacou a "institucionalização" da figura do provedor - apontando o exemplo recente da dupla Nuno Martins/Paquete de Oliveira.
A experiência como provedora dos leitores do Diário de Notícias foi um "treino excelente" para Estrela Serrano, membro da ERC, que concluiu a sua intervenção referindo que esse ponto da sua carreira foi "de alguma forma premonitório" em relação ao lugar onde está hoje.
"O provedor tem que medir muito bem aquilo que escreve", disse na apresentação do livro Para Compreender o Jornalismo. Ao DN Estrela Serrano clarificou esta ideia: "eu tinha a noção que os jornalistas olhavam à lupa para aquelas palavras. Uma palavra menos pensada ia dar origem a uma grande polémica", assumiu.
Marina Almeida, hoje no DIÁRIO DE NOTÍCIAS
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