Jornalismo e a lógica da economia de mercado
É a partir da premissa de que o jornalismo português está "entre a espada e a parede", sendo uma as tecnologias de informação e a outra a economia de mercado, que Sara Meireles Graça questiona, no livro "Os jornalistas portugueses", ontem lançado, em Coimbra, o futuro do jornalismo.
De um lado, considerou, está a forma "tradicional" de fazer jornalismo e do outro a tentativa de "alguns empresários das notícias" mais interessados em fazer "produto para vender e dar lucro". "Falta um plano de acção capaz de lutar pela manutenção do seu lugar", explicou a ex-jornalista e docente de Comunicação Social, que denunciou ainda uma adopção acrítica de novas tecnologias por parte de alguns jornalistas. Sublinhou que o jornalismo deve ser o "valor maior que a informação pública tem nas sociedades democráticas".
Segundo José Luís Garcia, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que apresentou a obra, o jornalismo não pode ser "uma simples venda de determinado tipo de produto", porque está associado à "transmissão de valores cívicos e culturais que dão sentido à vida colectiva"e estes "fazem parte da sua identidade". "O jornalista tem de estar diante da sua responsabilidade social", porque, explicou, cada vez mais a sociedade "vê o Mundo através dos média" e este olhar não pode ser sujeito "à exigência de que o seu trabalho se transforme num mero produto que tem de vender".
Tânia Moita
JN
Os jornalistas portugueses e os novos dilemas profissionais
"Os jornalistas trabalham no interior de uma indústria que, aliada às novas tecnologias, actua a um ritmo frenético de produção de notícias, num mercado globalizado e concorrencial". Para Sara Meireles Graça, professora na Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC) este é um dos factores que pode contribuir para um outro problema: o do jornalista se converter "numa espécie de tecnicista híbrido, confrontado com fortes constrangimentos de rentabilidade económica e tecnológica". Mas a autora vai mais longe: "encarado que é, na prática diária como mais uma peça, ainda que cognitiva, na engrenagem de produção nonstop de notícias, arrisca-se a não conseguir escapar ao poder e aos valores postulados pela indústria que o integra".
Na obra intitulada "Os jornalistas portugueses – Dos problemas de inserção aos novos dilemas profissionais" – e que ontem foi apresentada na ESEC – Sara Meireles Graça analisa as transformações tecnológicas e económicas que vieram alterar as práticas e os perfis profissionais dos jornalistas portugueses, com ênfase particular desde os anos 1990. A docente refere que desde essa época até aos nossos dias, se tem assistido "a modificações de grande alcance, quer na concepção e práticas do jornalismo, quer no contexto mais próximo em que o seu exercício profissional se actualiza".
Os problemas do acesso ao jornalismo – "pista determinante para percepcionar as mudanças no interior da profissão"- são também analisados nesta obra. Neste campo, a autora conclui que são os empresários que seleccionam candidatos, "sem critérios claros de recrutamento formal, submetendo os aspirantes a processos aleatórios de escolha, que passam, quase exclusivamente, pelo voluntarismo demonstrado às chefias, em períodos probatórios e experimentais cada vez mais extensos". "Não existem mecanismos de inclusão profissional ou métodos de aprendizagem estruturados no interior das empresas", critica.
Sara Meireles Graça aborda a conjugação dos movimentos de inovação tecnológica com as realidades da esfera comercial, numa fase em que o mercado é imposto como único mecanismo de regulação da economia. No entanto, lembra que, ultrapassada que está a "fase de renovação tecnológica" nas redacções, chegou a altura do "enriquecimento dos conteúdos em linha, devidamente adequados à reflexão e menos submetido a lógicas redaccionais obcecadas pelo marketing editorial".
A docente teve como fontes para este livro dados da última inquirição nacional realizada aos jornalistas portugueses e elementos estatísticos do Sindicato de Jornalistas e da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista. Recorreu também a artigos e pequenos estudos que têm vindo a ser produzidos nesta área, assim como a análises feitas noutros países europeus com problemas similares aos que ocorrem em Portugal.
Sara Graça é mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação pelo Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa e foi jornalista profissional entre 1996 e 2000 em publicações diárias, entre as quais no DIÁRIO AS BEIRAS. Encontra-se a fazer o doutoramento em Ciências Sociais, variante de Sociologia, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Patrícia Cruz Almeida
Diário As Beiras
terça-feira, junho 05, 2007
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